
D. Secco - Retrato da artista quando jovem cachorrinha
Mesmo recorrendo à narrativa a ao drama reiteradamente por motivos profissionais e, às vezes, até por prazer, não consigo ver um aspecto positivo no fato de que no Brasil as novelas (que são, na base, narrativa + drama) façam tamanho sucesso. É óbvio que o interesse de um programa como a novela é o de distrair a senhora que fica o dia inteiro lavando, cozinhando e passando (e também o senhor que chega cansado do trabalho), mas é também o de destruir a massa cinzenta de seus filhos (que estão na sala, de carona), instituindo em geral o padrão classe média alta (e oca) como modelo a ser seguido. Pode ser que a situação de fundo seja outra, isto é, pode ser que a mãe trabalhe fora e o pai fique em casa, mas o fato é que o quadro se repete, a julgar pelo índice de audiência das novelas, que só faz aumentar. Como se isso não bastasse, há também hoje uma novela para adolescentes – todos bonitos, graciosos, dentes alinhados e cabelos preparados para parecerem rebeldes -, meninos e meninas prontos para serem os hollow men do futuro. Agora, me espanta ver que essa “nova geração” que começa a se formar (nova apenas no sentido cronológico, pois a ignorância é algo muito antigo) tenha de sofrer a injunção de “formadores de opinião” que não mais se contentam com o mundinho banal em que estavam, apelando, sem nenhum pudor, para a necessidade de que sejam todos cultos, de que conheçam imediatamente filosofia, de que estejam prontos para falar com uma propriedade de superfície sobre assuntos antes relegados a velhos acadêmicos, todos muito velhos, empoeirados e pobres. Hoje é provável que você diga “Hegel” e a moça da Globo explique tudo sobre o autor alemão em uma parcelinha de um bloco qualquer do Fantástico.